sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

O SUSPIRO DA NOITE >> Sandra Modesto

 Minha crônica publicada no site da Cult Revista.



Querido sonho, você podia maneirar um pouco aí, cara.

Recorda quando eu sonhei leve livre sem tantos pesadelos alimentando minha alma? Minha paz anda meio perdida buscando meu sonho. Era tão real pisar descalça no meu jardim. Sem medo, sem espinhos destruindo minhas histórias.

Tento escrever e não consigo. Penso em sexo e durmo cansada. O meu sonho perdeu- se enquanto o mundo lá fora me assusta.

Enquanto as pessoas esmagam meus olhos. Leio as notícias e me arrepio num suspiro puxado. Onde estará o sonho dessa gente aflita, dessa gente que destila ódio? Eu não caibo mais nesse sonho. O meu sonho é paz. É desistir de pintar meus cabelos e não ser julgada.  É viver! Sonhar com uma realidade menos cruel. Onde é que eu estava quando alguém me iludiu com um sonho ridículo de que mulher velha não pode ser linda?

Puta merda! Nesses meus sessenta anos alguém me chamou um dia desses, de velha louca. Sou. E o meu sonho foi construído bem próximo da loucura. E cresce dia após dia. Na esperança de tudo se ajeitar. Meu sonho é postar meu cartão de vacina contra Covid. Eu não serei eterna. Mas ainda pretendo sonhar. Um sonho de cada vez. Um flash do meu cotidiano em busca da justiça social. Quem sabe.

 

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Antologia

Olá! Estou no projeto da primeira antologia do Corvo Literário.

O lançamento será no próximo mês. 

Reparem na capa maravilhosa!

Conheçam os escritores seguindo o site no link abaixo...











https://corvoliterario.com/

domingo, 14 de fevereiro de 2021

MINHA VIDA VEGETARIANA >> Sandra Modesto












MINHA VIDA VEGETARIANA

Eu nasci numa família do interior de Minas e cresci comendo muita carne. Mas não faltaram frutas, saladas e legumes que eram degustados por uns, nem sempre por todos. Não sei se meu paladar é relevante neste texto, mas arroz com feijão e farinha é uma refeição protagonista no meu dia a dia. Na vida a gente carrega tantas histórias, tantas memórias e o cheiro de tudo.

No isolamento e convivência diária com filho e marido há silêncios, diálogos e relampejo de decisões. Optamos primeiramente, não comer carne uma vez por semana. Tudo bem. Eis que fomos mais além. Deixamos de comer carne.

Foi uma decisão difícil. E o churrasco? E o bife acebolado? E a bisteca? As iguarias que acompanham uma boa feijoada? A galinhada amarelinha? Poxa!

Meu filho conversou comigo me lembrando do sofrimento dos animais, do lucro dos pecuaristas, enfim, eu ouvi atenta. Bom, ser vegetariana aos sessenta anos poderia prejudicar minha saúde? Eu preciso de proteína. Consultei uma nutricionista para o aval final. Minha alimentação é rica em tudo. Eu adoro frutas, vegetais, grãos, castanhas. Posso retirar a carne com tranquilidade. Retirei.

E me veio à memória o frango vivo que minha mãe matava pra gente comer no almoço dos domingos. Eu era criança. O frango pulando com sangue escorrendo pelo pescoço, até ele morrer.  Depois ia pra uma panela com água quente, era depenado, picado...   

Quem gosta de carne não é inferior por gostar. Mas pense num molho de quiabo com abobrinha, uma couve refogada, uma manga e uma banana de sobremesa?

E berinjela á milanesa? Amo! Meu marido cuida do cardápio.

Comprei uma coleção de porta prato de crochê da minha irmã, pra exibir nessa minha nova vida.

   

terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

O dia de ver minha mãe

 Na tarde de ontem eu dormi um pouco. E sonhei…


Minha mãe já morreu, mas meu sonho foi assim.


Ela estava na cadeira de fio na varanda da casa em que moramos por muitos anos.


Eu a olhei. Olhares cruzados. Voz cansada.


Sem entender que o mundo dentro da gente virou do avesso.


Perguntou se eu queria colo. Café, chá de canela, afago.


_ Não, mãe.


_ Isso é escolha?


_ É grupo de risco, mãe.


Cuidados não faltaram, carinhos. Nada. Nada adiantou.


Apenas poderosos com punhos cerrados clamando mortes. Lucro, lucro. E lutos.


_ Entendeu mãe? O moço disse que velhos vão morrer mesmo.


Minha mãe começou o estranho caminho à morte.


O caixão. Sem velório.


Eu acordei depois de um pulo da cama.


O lençol, o travesseiro, o espelho.


Mundo, vasto mundo. Mães morrendo. Seria a solução?


“Porque eu ainda estou por aqui”.·.



Biblioteca virtual do Elicer Minas

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