Ruas
Nuas
Sandra Modesto
A
mulher caminha dentro de si. Há sempre um espaço que a incomoda. Mas nada
adianta. Olhar as próprias ruas cerceadas na casa. Só, a mulher buscando os
beijos separados diante do novo cenário. Os abraços ainda fomentados por
lembranças do último momento, quando tudo era tão físico.
Chora,
senta, liga o celular, as brechas da paixão estateladas. Agora o amor arde,
pede passagem, e nada pode. Não pode o encontro, não pode rasgar o mundo em
sonhos Apenas ensaiar a música que cantaram no bar onde tudo começou.
Às
vezes a solidão faz companhia. Hoje teve chamada de vídeo. De longe os
sentimentos se embaraçam, dúvidas, estranhezas, o amor é utópico, o amor é
insensatez. Ninguém é capaz de amar do mesmo jeito.
Ela
joga a calcinha nova numa gaveta e busca a chave. Quis uma trepada boa antes de
março, não deu. Foi preciso buscar um novo olhar para aquele amor que há meses,
dilacera muitas vontades procurando silêncios e respostas.
E
se...
Se
ele viesse com máscara, só pra dizer que depois do fim da clausura, os
orgasmos, a fluidez dos beijos... Gemidos e lambidas voltariam?
Por
acaso o porteiro trouxe uma encomenda. Uma carta de amor. Há tempos não lia uma
carta de amor tão ridícula, escrita à mão?
Ela
pega. Dança pela sala, joga perfume nos cabelos, toma o vinho tinto, lê aos
berros:
“Nossos
sonhos ávidos ainda serão reais”
A partir daquele momento a solidão virou um
quadro desenhado ao vivo.
A
mulher nua na nova rua
Lambuza-se e acaricia partes do corpo. Fecha a
porta do quarto.
Enquanto
o amor rola embriagado matando saudades.
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