CRUZAMENTOS
Estava sozinha e usava jeans com chinelos.
Subindo a pé naquela rua, notou que lavavam o carro na calçada de uma casa.
Esfregavam e enxaguavam juntos; as rodas, pneus,
partes do fusca. Branco.
O portão estava bem aberto.
Olhou cenas reais. Muitas pessoas em movimento.
Uma mulher várias crianças um cachorro, cadeiras,
plantas, conversas, risos, tudo natural, não fosse à personagem principal. Uma
senhora idosa, sentada em uma cadeira.
Usava um vestido florido, os cabelos e a
pele denotando a passagem transformadora do tempo. Gesticulava movimentos
trêmulos, boca entreaberta, mas ao derredor, pessoas mais jovens consideravam a
mais velha da casa, como parte de um todo. Escolheram não abandonar, não
depositar no asilo, queriam, preferiram assim. A personagem à cadeira não
entendia nada. Não sabia mais quem era quem, não sabia mais nem quem era ela. E
daí?
A mulher que caminhava sozinha e usava jeans, era
eu.
Enquanto andava fiquei me perguntando:
Será que tenho medo da morte ou tenho medo de
morrer?
Vou morrer amanhã, domingo? Vou morrer...
Veio-me a memória musical; Gilberto Gil.
NÃO TENHO MEDO DA MORTE
“Não tenho medo da morte
Mas medo de morrer, sim.
A morte e depois de mim
Mas quem vai morrer sou eu
O derradeiro ato meu
E eu terei de estar presente
Assim como um presidente
Dando posse ao sucessor
Terei que morrer vivendo”.
Sandra Modesto. Autora do texto 1.
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